O término de uma relação de emprego, com o encerramento do vínculo entre as partes, pode acontecer por diversos motivos. As formas de extinção de contratos de trabalho estão previstas na CLT, que regulamenta os direitos e obrigações das partes em cada caso, já que a modalidade de demissão ocorrida, enseja o pagamento de diferentes verbas rescisórias.
Neste texto, abordaremos apenas a modalidade de rescisão do contrato de trabalho por justa causa.
A justa causa resulta no encerramento de um contrato de trabalho, e acontece quando o empregado comete a prática de algum ato (seja de natureza pessoal, seja por descumprimento de obrigações contratuais) que tem como consequência o abalo da confiança ou boa-fé que existe na relação entre empregado e empregador, passando a ser insustentável a manutenção do contrato de trabalho.
Os atos faltosos, estão previstos no art. 482 da CLT, sendo:
- ato de improbidade, que pode ser entendido como toda ação ou omissão desonesta do empregado, que revele abuso de confiança, fraude ou má-fé, visando a uma vantagem para si ou para outrem;
- incontinência de conduta ou mau procedimento;
- negociação habitual por conta própria ou alheia sem permissão do empregador, e quando constituir ato de concorrência à empresa para a qual trabalha o empregado, ou for prejudicial ao serviço;
- condenação criminal do empregado definitiva (com trânsito em julgado), caso não tenha havido suspensão da execução da pena;
- desídia no desempenho das respectivas funções, que pode ser considerada como um conjunto reiterado de faltas, que mostram a omissão do empregado no serviço. Uma só falta não vai caracterizar a desídia. As faltas anteriores devem, porém, ter sido objeto de punição ao empregado, ainda que sob a forma de advertência verbal. A configuração se dará com a última.
- embriaguez habitual ou em serviço;
- violação de segredo da empresa;
- ato de indisciplina ou de insubordinação. Aqui, vale discorrer sobre a diferença da “indisciplina” e da “insubordinação”. A indisciplina é uma falta caracterizada pelo descumprimento de regras gerais produzidas pelo poder organizacional do empregador. Nessa espécie de violação o empregado não afronta o chefe ou superior hierárquico, mas sim um comando abstrato. A insubordinação, por sua vez, é falta caracterizada pelo descumprimento de um comando específico, egresso diretamente de um superior hierárquico.
- abandono de emprego, que pode ser entendido como a recusa tácita do trabalhador de cumprir sua obrigação principal de prestar trabalho. É caracterizado pela existência de um elemento objetivo, a ausência injustificada e prolongada, e um elemento subjetivo, a intenção do empregado de não mais retornar ao trabalho. Assim, pela jurisprudência, o prazo considerado para a caracterização do abandono de emprego, é a ausência contínua do empregado, por 30 dias (Súmula 32, do TST).
Contudo, neste caso, alguns cuidados devem ser tomados pela empresa. Diante do princípio da continuidade da relação de emprego e considerando-se a característica alimentar das verbas salariais, que custeiam a sobrevivência do trabalhador e, comumente, de sua família, o mero envio de telegramas, ato unilateral da empresa, não é suficiente para provar o abandono de emprego. Esse ato tem que ser praticado com a cautela da descrição no corpo do telegrama, do fato ao qual aquele telegrama se refere, no caso abandono de emprego, certificando-se o empregador de que foi enviado para endereço correto do empregado, e que este, de fato, o recebeu. O envio deve ser reiterado. Uma única convocação para retorno ao trabalho, não vem sendo aceita pela jurisprudência.
- ato lesivo da honra ou da boa fama praticado no serviço contra qualquer pessoa, ou ofensas físicas, nas mesmas condições, salvo em caso de legítima defesa, própria ou de outrem;
- ato lesivo da honra ou da boa fama ou ofensas físicas praticadas contra o empregador e superiores hierárquicos, salvo em caso de legítima defesa, própria ou de outrem;
- prática constante de jogos de azar.
- perda da habilitação ou dos requisitos estabelecidos em lei para o exercício da profissão, em decorrência de conduta dolosa do empregado.
Essa modalidade de falta, capaz de ensejar a justa causa de um empregado, foi incluída recentemente pela Lei nº 13.467, de 2017, conhecida como reforma trabalhista.
Contudo, exercer uma profissão sem a respectiva habilitação é contravenção penal (art. 47 do Decreto 3.688/1941) e por isso, o fato já impede o trabalhador de exercê-la. Dessa forma, anteriormente à referida inclusão, se o empregado o fizesse, estaria enquadrado na alínea “a” do art. 482.
A CLT prevê ainda, no parágrafo único do citado art. 482, que também constitui justa causa para dispensa de empregado a prática, devidamente comprovada em inquérito administrativo, de atos atentatórios à segurança nacional.
A experiência demonstra que é comum a existência da gradação na aplicação das penalidades, a saber: advertências, suspensão e, por fim, a dispensa com justa causa.
Essa sequência denota a preocupação do empregador em não prejudicar o empregado com a rescisão do contrato, já que as verbas rescisórias devidas ao empregado, nesta hipótese, são restritas à saldo de salário; férias vencidas, com acréscimo de 1/3 constitucional; salário-família (quando for o caso); e depósito do FGTS do mês da rescisão. Não receberá férias proporcionais e 13º salário proporcional (parágrafo único do artigo 146, da CLT e Súmula 171 – férias proporcionais; e artigo 3º da Lei 4.090/62, que disciplina que o 13º salário proporcional é devido quando a dispensa do empregado ocorrer sem justa causa). Também não poderá sacar o FGTS e tampouco fará jus à multa dos 40% ou ao Seguro Desemprego.
Para tanto, em geral, são necessários três requisitos para caracterização da justa causa, quais sejam: a previsão legal, a atualidade ou imediatidade da falta (ou seja, tão logo tenha o empregador conhecimento da prática do ato faltoso, deve agir e rescindir o contrato – se não o fizer, será entendido como um “perdão tácito” e o empregado facilmente reverterá a justa causa em um processo trabalhista) e a proporcionalidade entre a falta praticada e a punição respectiva.
Maior atenção ainda, deve ser dada à modalidade da desídia, em que há necessariamente que se aguardar o decurso do prazo para a caracterização do abandono. Assim, o pressuposto de imediatidade que rege a dispensa por justa causa é compatível com a justificação da desídia, todavia, é de alguma forma mitigado, ante à própria natureza da infração. Deve, portanto, agir o empregador o mais breve possível neste caso.
No mais, quando o empregador invoca a justa causa na ruptura contratual, atrai para si o ônus probatório respectivo, caso o empregado ingresse com uma ação na justiça do trabalho, para reverter a aplicação da justa causa, e poder assim, receber a integralidade de suas verbas rescisórias.
É importante ressaltar que a prova da justa causa deve ser ampla, robusta e inequivocamente demonstrada, em razão das sérias consequências que acarreta ao empregado, seja do ponto de vista pessoal, seja do ponto de vista profissional, assim contratempos futuros podem ser evitados.
Para outras dúvidas sobre a demissão por justa causa e os riscos jurídicos que essa decisão pode trazer para a sua empresa, consulte nossos especialistas.
Até o próximo artigo!
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Flávia Maria D. de Oliveira
Apaixonada pelo Direto, pelo mundo dos negócios e pela sua família. É sócia-diretora da AFO Advogados, realiza mensalmente a Vinhoterapia Empresarial e está a frente de inúmeras iniciativas empresariais com o objetivo de fomentar o crescimento de empresas e de pessoas.
Carla Russomano Fagundes
Advogada que há mais de 13 anos milita na área empresarial. Graduada pela Faculdade de Direito de São Bernardo do Campo, pós-graduada em Direito e Relações do Trabalho pela mesma instituição.